UNESP

01/01/1995 – Universidade Estadual Paulista – Universidade – Nereide Schilaro Santa Rosa

A EDUCAÇÃO MUSICAL NA ESCOLA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO INFANTIL DA CIDADE DE SÃO PAULO (Click para ver o artigo original)

• RESUMO: O objetivo deste artigo é demonstrar a importância do trabalho sistematizado da educação musical com crianças de 4 a 6 anos, e como o educador musical pode gerar um contexto pedagógico que auxilie na construção da concepção de mundo na criança da Escola Municipal de Educação Infantil da Secretaria Municipal de Educação, da Prefeitura do Município de São Paulo – Brasil.
• PALAVRAS-CHAVE: Educação musical; educação infantil; educador musical.

Introdução
O atendimento público à criança paulistana, em 1935, tornou-se necessário devido à expansão econômica, à abertura de indústrias e ao aumento da população, acrescida pelos imigrantes.
Assim, para satisfazer às necessidades, foram criados os Parques Infantis. Inicialmente, cinco parques atendiam crianças de 3 a 12 anos, das 7h 30 às 18h, funcionando em grandes áreas arborizadas, nos bairros com maior expansão industrial e populacional e onde já se configurava a mão-de-obra feminina dentro das fábricas.
Em 1942, São Paulo já contava com sete parques: Brás, Mooca, Lapa, Ipiranga, Santo Amaro, Barra Funda, Catumbi, Vila Romana.
As atividades eram voltadas à formação do corpo, com a recreação, o jogo organizado, “ministrando-lhes, simultaneamente, toda a assistência necessária…” (Miranda, 1941, p.20).
Segundo Nicanor Miranda (1941, p.19), os Parques Infantis funcionavam no período diurno, e atendiam rapazes de 13 a 21 anos, no período noturno, nos Clubes de Menores Operários. As crianças estavam envolvidas com atividades dirigidas e acompanhadas constantemente pelas recreacionistas.
O Decreto-lei n.430, de 8.7.1947, transformou a Secretaria de Cultura e Higiene em Secretaria de Higiene e Secretaria de Educação e Cultura. O quadro dos Parques Infantis era formado por:
• instrutor (formado em Educação Física);
• educador sanitário;
• educador musical (com certificado de Conservatório);
• educador recreacionista;
• médico e dentista.
A Educação Física, segundo Nicanor Miranda, envolvia e era subentendida como assistência médica, exames periódicos de saúde, regimes dietéticos, serviço social e pesquisas científicas relativas ao educando, sua família e respectivas condições mesológicas.
As atividades também apresentavam um aspecto pré-profissionalizante, pois o trabalho manual era muito desenvolvido e com enfoque em bordados e tecelagem.
O trabalho tinha um caráter assistencialista, uma vez que não havia uma proposta pedagógica sistematizada, as atividades não eram em período integral e nem havia alimentação organizada (merenda). Existia, sim, uma preocupação de se retirar as crianças da rua, em razão de as mães começarem a trabalhar fora de casa, em indústrias, e do grande número de crianças, principalmente imigrantes, que moravam em cortiços e “precisavam de sol e espaço”.
Nota-se que, mesmo sem uma sistemática pedagógica formal, trabalhava-se com o espaço (na recreação e na educação física), com a lógica (nos trabalhos manuais e jogos organizados) e com a linguagem (na educação musical). Evidentemente, isso acontecia de uma maneira espontânea, nas atividades norteadoras do trabalho.

O papel da música no Parque Infantil
A música sempre esteve presente no Parque Infantil.
O folclore brasileiro, através de rodas cantadas, danças, canções, e as músicas cívicas, de autores como Aricó Júnior, Lorenzo Fernandes, Sólon Borges dos Reis, Joubert de Carvalho e outros, eram lembradas e tocadas. O grupo de intelectuais responsável pela gênese dos Parques Infantis apresentava em seu bojo figuras como Mário de Andrade e Paulo Duarte, todos voltados ao incentivo e preservação da cultura brasileira.
Nessa época, a música popular brasileira era muito valorizada. Através do rádio, grandes compositores e cantores brasileiros levavam a nossa cultura musical a todos. A criança tinha oportunidade de ouvir samba, maxixe, marchinhas, baião, músicas de roda, marchas de carnaval, quadrilhas etc. Isso fazia que a música brasileira fosse parte integrante da vida das pessoas. A criança ouvia em casa, com seus pais, e na escola, com suas educadoras.
A seguir, temos o depoimento da educadora musical Vitalina Abreu Accioli,2 que nos conta sobre o desenvolvimento do trabalho com a educação musical nos parques:

Eu era diretamente vinculada ao maestro Martin Braunwieser, Conselheiro de Educação Musical. Nós recebíamos dele, em reuniões semestrais, orientação quanto ã programação que se deveria desenvolver. Eu lembro que havia aquele calhamaço de músicas para todas as datas a serem comemoradas. Ele fazia muita questão das comemorações cívicas, embora não fosse brasileiro. Nós recebíamos material nas reuniões, além de exemplos e sugestões. Por exemplo, roda cantada ele dava uma e a gente pesquisava para ampliar o repertório. Era preciso trabalhar com todas as turmas, com números diferentes de acordo com as faixas etárias, adequando o trabalho. E, nessas atividades, ele fazia muita questão que se desenvolvesse o folclore brasileiro porque era um ardoroso amante do Brasil. Dava-se muita música folclórica, cantigas de roda, e se fazia muita questão das bandinhas rítmicas. Alguns instrumentos a gente recebia, outros a gente construía com latinha de fermento, cabo de vassoura, tampinha, casca de coco. Nesta bandinha, a gente era orientada para incluir até os pequenininhos, porque era todo um trabalho de desenvolvimento rítmico. A gente ensinava a letra das canções, ritmava e as crianças iam falando. Também desenvolvíamos a percepção auditiva e a linguagem, dentro da Educação Musical. O maestro fazia questão que a gente não aceitasse que “ensinávamos musiquinhas”, por causa do trabalho que estava por trás. Em 1957, já havia muitos parques e não havia educadora musical para todos. Então houve uma reunião e eu fui a primeira a trabalhar em dois parques, porque o maestro achou que se houvesse três dias de aula por semana, era melhor que nada. Então se alternava Parque Infantil e período. Houve muita controvérsia porque tivemos que reelaborar o trabalho. Tudo era anotado nos relatórios que eram passados para o maestro que os citava nominalmente em reuniões. (Revista, 1985, p.22).

Os parques se expandem…
De 1947 a 1955, os Parques Infantis aumentaram de nove para cinqüenta; em 1956, criaram-se 34 novos parques. Nota-se que a criação de novos parques era interessante, pois representava um impacto político ante a população.
De 1947 a 1955, os Parques Infantis aumentaram de nove para cinqüenta; em 1956, criaram-se 34 novos parques. Nota-se que a criação de novos parques era interessante, pois representava um impacto político ante a população.
0 educador musical, em 1969, aparecia com um trabalho bem definido no Decreto n.7.895, de 14.1.1969.3.
1 Despertar e aprimorar o patrimônio musical do aluno, através de conjuntos vocais e instrumentais, bandinha rítmica, brinquedos e rodas cantadas, danças e músicas folclóricas, iniciação musical e ensino instrumental.
2 Colocar a música como elemento de disciplina, socialização e formação moral, cívica, intelectual, artística e estética do aluno.
3 Elevar o nível das comemorações cívicas e sociais, através de repertório adequado.
4 Utilizar a música como função terapêutica (arritmias, disfasias, deficiências de audição e educação de excepcionais).
5 Executar tarefas afins.
Nota-se, portanto, que o trabalho com a educação musical estava cada vez mais valorizado e se intensificando; a idéia do maestro Martin Braunwieser continuava a florescer: o trabalho com a música era muito mais do que “ensinar musiquinhas”.
Na gestão do prefeito Paulo Maluf (1968/1971) foram criadas 188 classes de ensino pré-primário nos parques já existentes.
A preocupação em realizar um trabalho educativo sistematizado no parque e o abandono da ênfase assistencial e médica terminam por questionar o caráter recrea-tivo, próprio das atividades então realizadas nos parques. As perspectivas antes adotadas com enfoque recreacional dirigido, lúdico-expressivo espontaneísta, e o aprendizado pelo trabalho prático para os mais velhos passaram a conviver com discursos do ensino pré-escolar que defendiam, na época, uma didática que garantisse maior desenvolvimento da prontidão para a alfabetização (Revista, 1985).
Em 1967, existiam quarenta cargos de educador musical, sendo 25 no padrão L, com provimento por concurso de provas e títulos, e 15 no padrão M, com provimento mediante promoção. Os candidatos deveriam ser portadores de diploma de Canto Orfeônico e Conservatório Musical reconhecido oficialmente.
Mas a lei de Diretrizes e Bases n.5.692, de 1971, instituiu a introdução da Educação Artística no currículo das escolas. Sendo assim, a educação musical passou a ser um dos itens trabalhados em Educação Artística, junto com desenho e expressão plástica. Desta maneira, os cursos superiores foram reestruturados e a educação musical passou a integrar o curso de Licenciatura em Educação Artística, com Habilitação em Música, Plástica, Desenho e Cênicas.
Muitas vezes, o futuro professor de música não possuía nenhum conhecimento específico de educação musical, em conseqüência do que o trabalho sistematizado e especializado em música foi se diluindo com o passar dos anos.
Com o desaparecimento da música do currículo das escolas de primeiro grau, a criança também começou a perder a oportunidade de ouvir e aprender a cultura musical do Brasil, e cada vez mais a música estrangeira tornou-se presente.

Surgem as EMEIS…
Em 1972, os parques passaram a atender crianças de 3 a 7 anos, e em 1975, foi criada a Secretaria de Educação desmembrada da Secretaria de Cultura. Os parques passaram a denominar-se Escolas Municipais de Educação Infantil EMEI, vinculadas ao Departamento de Educação Infantil que substituiu o Departamento de Educação e Recreio.
Em 1975, o educador musical, na EMEI, fazia parte do Quadro do Ensino Municipal com cinqüenta cargos e com atribuições bem definidas,4 entre elas a elaboração do planejamento anual, a seleção de estratégias, a integração com atividades desenvolvidas nas escolas e a organização de campanhas e comemorações cívicas e sociais.
Porém, a partir de então, esses cargos já apareciam com uma observação muito séria e importante: “cargos em extinção na vacância”, um reflexo da Lei de Diretrizes e Bases, na qual a educação musical oficialmente começou a ser trabalhada em Educação Artística, sem especificidade, mas que na realidade nunca deixou de ser praticada, mesmo que de uma forma assistemática, e quase imperceptível. Quantos trabalhos musicais, desenvolvidos em escolas, se perderam através dos tempos? Com certeza, muitos… A música é tão importante quanto a fala para o ser humano … pois “música reflete a vida, tanto quanto a arte ou a literatura” (Galway, 1987, p. 10).
Entre 1976 e 1978, as educadoras musicais foram muito requisitadas nos treinamentos específicos do Plano de Educação Infantil (PLANEDI).
Nesse Plano havia o aproveitamento de mães de alunos como monitoras, as quais eram treinadas e capacitadas para trabalhar com a professora em atividades de Música (rodas cantadas, danças, canções) e de Educação Física. Várias propostas, de diferentes administrações, mostraram-se conflitantes, porque, enquanto todos davam ênfase e reconheciam a importância do desenvolvimento do aluno nesta forma de expressão, e maximizavam o trabalho do educador musical em exercício, nenhuma administração tomou providências a fim de contar com o trabalho realmente especia-lizado em música.
Na Portaria n.9.399,5 o educador musical apareceu no capítulo das disposições transitórias. Ele deveria participar do Plano Escolar, desenvolver atividades com as classes nos três estágios, auxiliar o corpo docente em campanhas cívico-pedagógicas, religiosas e socioculturais previstas no Calendário Escolar e exercer outras atribuições que lhe fossem cometidas pelo Diretor da escola onde atuava.
Segundo essa Portaria, as atividades musicais eram desenvolvidas dentro do conteúdo curricular vigente na época, na área psicológica, como domínio afetivo.
No Plano Trienal 1985/1987 foi apontada a necessidade de valorização do professor, investindo em sua competência e implantando uma nova programação que enfatizava o desenvolvimento cognitivo e lingüístico dos alunos, porém sem referência específica sobre educação musical.
Na gestão do prefeito Jânio Quadros (1986/1989), foram realizados alguns treinamentos optativos, em que a educação musical era entendida como recurso no desenvolvimento cognitivo.
No Regimento Comum das Escolas Municipais de São Paulo, de agosto de 1992, não consta o educador musical na equipe docente: ele passa a ser denominado Professor Titular de Ensino Fundamental II, e a expressão musical faz parte do quadro curricular da EMEI, entre as áreas do conhecimento, considerada uma linguagem que “deve ser entendida como conteúdo e não apenas como recurso para a construção de outros conhecimentos”.
Cada vez mais, a cultura musical brasileira é desvalorizada; a influência e a presença da música comercial é avassaladora. A criança só tem oportunidade de ouvir o que lhe é imposto pela mídia. E na escola… pouco se oferece também … até porque a maioria dos professores não tem qualquer instrução específica. Cabe a nós, educadores musicais ou não, darmos oportunidade a essa criança para que descubra a beleza e a importância da música, principalmente a brasileira. Proporcionar a todos ensinamentos de educação musical, apropriada pelas mais altas camadas da socie-dade, é igualar oportunidades, é democratizar a educação.
Atualmente, tramitam na Câmara dos Deputados propostas que indicam a preocupação das autoridades em preservar, novamente, a especificidade de cada linguagem artística.
Analisando o resgate histórico da educação musical na EMEI, chega-se à conclusão de que a música foi parte primordial de todo o trabalho desenvolvido nestes sessenta anos.
A música contribuiu para a formação de milhares de cidadãos paulistanos que freqüentaram os Parques Infantis e, depois, as Escolas Municipais de Educação Infantil.
A educadora musical teve atuação marcante na história da EMEI, desde uma atividade corriqueira na sala de aula até as grandes comemorações cívicas que eram realizadas.
Hoje, somam-se em torno de 350 Escolas Municipais de Educação Infantil, que atendem crianças de 4 a 6 anos, a maioria em período parcial (quatro horas). Em 1993, estavam funcionando 338 escolas, que atendiam 174.699 alunos (Secretaria Municipal de Planejamento).7 O atendimento público dessa faixa etária na cidade de São Paulo está sendo realizado exclusivamente pela Prefeitura do Município nas EMEIs, em classes de PLANEDI que funcionam nas escolas de primeiro grau e em Classes Comunitárias.
A orientação pedagógica das equipes técnicas das escolas é realizada pela Divisão de Orientação Técnica (DOT), subordinada à Superintendência do Ensino Municipal (SUPEME). É a Divisão de Orientação Técnica de Educação Infantil e Alfabetização (DOT/3), sob orientação da Sra. Diretora Sylvia Paula de Almeida Torres Vilhena, subordinada à DOT, que orienta e subsidia as Delegacias Regionais de Ensino Municipal (DREM’s), as equipes técnicas das EMEIs, compostas por diretores, assis-tentes, coordenadores pedagógicos e suas equipes docentes.
A equipe musical da DOT/3, sob nossa responsabilidade, em vista do histórico por nós pesquisado, o que demonstrou como o trabalho com a educação musical era valorizado, interessante e, mais do que tudo, auxiliava no desenvolvimento integral da criança, resolveu delinear suas ações objetivando a efetivação de um trabalho consistente e sério com a educação musical na EMEI a partir de 1993.
Para tanto, ao iniciarmos nossa gestão em janeiro do citado ano, enviamos uma pesquisa a todas as EMEIs, com questões que pudessem nos direcionar quanto à realidade da música na educação infantil municipal. Esta pesquisa está registrada como Co DOT G Rt 007/93, arquivada na Memória Técnica Documental da Secretaria Municipal de Educação, e nos indicou que todas as equipes técnicas e docentes das EMEIs deixam clara a importância da educação musical para a criança de 4 a 6 anos. O relatório também aponta a unanimidade quanto à necessidade da presença de um especialista musical na escola, para trabalhar de forma integrada com os professores, e cita até mesmo o trabalho que era anteriormente desenvolvido pelas educadoras musicais.
A professora da EMEI sabe da importância de se trabalhar com a música, mas muitas vezes, por várias razões, não trabalha… e a criança perde essa oportunidade.
Dentre estas razões, podemos citar: a falta de sistematização e avaliação do trabalho musical, a falta da conscientização da importância da música para o homem e para a criança e a falta de conhecimento sobre a educação musical.
Quanto a esta última, deparamos com a falta de profissionais com conhecimento musical específico, fato decorrente de a educação musical estar atrelada à Educação Artística, esvaziando sua especificidade. Muito maior ainda é a dificuldade de contarmos com educador musical especializado em educação infantil.
Sendo assim, a atual situação da educação musical é esta: profissionais insufi-cientes, em decorrência do argumento de que não há campo de atuação e vice-versa, a educação musical não é trabalhada com nossas crianças por não possuirmos especialistas suficientes. Se proporcionarmos um espaço para a atuação destes profissionais, certamente sentiremos os reflexos desta ação no aumento de interessa-dos nos cursos e no retorno de um trabalho musical tão importante para nossos alunos. Por tudo isso, faz-se necessário resgatar o trabalho específico com a linguagem musical nas escolas e, em nosso caso específico, nas Escolas Municipais de Educação Infantil, já que foram as pioneiras, conforme visto no histórico.
Devemos proporcionar uma educação que viabilize a manifestação integral da criança, participante, atuante, crítica e criativa.
Assim, o desenvolvimento cognitivo da criança pode e deve ser trabalhado com as atividades musicais. Para tanto, a professora deve conhecer o desenvolvimento de seus alunos, adequar as atividades musicais e questionar constantemente todas as suas produções, fazendo que a criança elabore e reelabore constantemente suas estruturas musicais.
Assim, vejamos:
O bebê ouve sons, tais como a voz da mãe, canções de ninar, chocalhos, porém estes não permanecem, isto é, ele os relaciona com um bem-estar momentâneo. Assim, quando a mãe se aproxima falando ou cantando, o bebê se acalma, há uma busca de compatibilização harmônica.
No final do período sensório-motor, a criança já constrói grupamentos, apresenta reversibilidade na ação e tem a conservação do objeto (imagem mental); podemos observar isso em atividades musicais quando a criança se acalma ouvindo uma voz conhecida, isto é, ela consegue reconhecer e identificar um som já anteriormente escutado.
No período pré-operatório, a função semiótica já está presente, e em suas formas de conduta, a música é trabalhada na imitação, no jogo simbólico, no sistema de símbolos, como auxiliar ao processo de representação da criança. A criança imita os sons que lhe são significativos, classifica sons de acordo com a altura, intensidade, duração, timbre, ritmo/andamento, faz seqüência de sons através do canto e do ritmo com os instrumentos de bandinha e vale-se da música no jogo simbólico nos momentos em que ela dramatiza e brinca com os sons no faz-de-conta. O desenvol-vimento auditivo também deve ser trabalhado neste período, pois é fundamental para o desenvolvimento da linguagem e, posteriormente, para a leitura e a escrita.
A criança que já constrói estruturas mentais, que apresenta reversibilidade no pensamento e conservação de quantidade, também na música consegue relacionar a duração dos sons, isto é, relacionar o valor de uma semibreve com duas mínimas ou de duas mínimas com uma semibreve. Para que uma criança consiga relacionar a duração dos sons, deve-se fazer que ela própria represente seus símbolos, perceba a variação da duração dos sons com atividades em que a proposta seja de descoberta, de pesquisa, de criatividade, de expressividade e, principalmente, de envolvimento e não somente através de símbolos musicais. A criança questionada pelo professor aprende e descobre por si própria, no exercício de suas hipóteses, o valor de cada som, de acordo com o conhecimento que ela já conseguiu desenvolver em sua vida: cabe ao professor conhecer a criança, para proporcionar-lhe oportunidades. Se, em vez de questioná-la com desafios, o professor adotar uma postura apriorista de só considerar a expressividade livre musical da criança, ou então adotar uma postura empirista de se considerar como o “detentor do saber” ensaiando canções mecanica-mente, a criança não terá oportunidade de construir seu conhecimento, exercitando suas próprias hipóteses, desenvolvendo uma boa auto-imagem, apropriando-se e valendo-se da diversidade de formas de expressão utilizadas pela sociedade, pois desta forma ela não é desafiada a agir em novos contextos. Numa postura interacio-nista, ela está em condições de desenvolver estruturas musicais, estabelecendo relações sonoras, desafiando o seu pensamento, construindo sua concepção de mundo.
Ao considerarmos que, para se construir o entendimento sobre si próprio e do mundo, é necessário agir, atuando sobre o meio assim como o meio atua sobre o indivíduo; que a arte faz parte das formas de se conhecer o mundo e a si próprio, entre elas a linguagem musical; que esta inicia-se por meio da interação com o ambiente; que a criança se envolve integralmente com a música e a modifica constantemente, transformando-a, pouco a pouco, numa resposta estruturada; que a educação musical proporciona a vivência da linguagem musical como um dos meios de representação do saber construído pela interação intelectual e afetiva da criança com o meio ambiente, a Equipe Musical da DOT/3 elaborou sua ação, balizada nos cinco eixos propostos para a política educacional da (Secretaria Municipal de Educação) SME,8 em quatro níveis de atuação:
1 Subsidiar e avaliar os projetos musicais das EMEIs, através de encontros com várias escolas, seleção e/ou instrução sobre confecção de material didático-musical.
2 Cursos de capacitação: dar oportunidade a professores interessados em mú-sica, mesmo que não estejam envolvidos em projetos musicais, através de cursos, oficinas.
3 Eventos musicais nas EMEIs: integração com diferentes instituições musicais, para a realização de eventos envolvendo os alunos das EMEIs, a fim de despertar o interesse pela música e dar oportunidade aos alunos de contato com diferentes estilos musicais, notadamente música erudita e folclórica.
4 Orientação pedagógico-musical a pessoal interessado em desenvolver proje-tos musicais nas EMEIs, especialmente proíessores titulares de Educação Infantil com habilitação em Música.
5 Propor novos caminhos para a efetivação do trabalho com a educação musical na EMEI.
Para implementar o trabalho de Educação Musical na EMEI, está sendo implan-tado um Projeto-Piloto de Formação de Monitores Musicais da EMEI, desenvolvido sob a coordenação da equipe musical da DOT/3, envolvendo instituições como a Escola Municipal de Música da Secretaria Municipal de Cultura, o Instituto de Artes da UNESP e outras instituições.
Este projeto-piloto procura atender às solicitações da Rede Municipal de Ensino, demonstradas na pesquisa citada anteriormente no que tange à volta do especialista musical na EMEI. É desenvolvido com alunos de instituições que formam musicistas ou professores de música, atuando com alunos das Escolas Municipais de Educação Infantil por meio de estágios não-remunerados.
Durante o ano de 1994 foram atendidas vinte EMEIs, perfazendo um total de 4 mil alunos. Estas unidades escolares foram inicialmente escolhidas segundo a proxi-midade de residência dos estagiários e pelo interesse das equipes técnica e docente da escola em participar do projeto. Iniciamos com inscrições optativas nas instituições, em seguida os estagiários inscritos participaram de Seminários9 sob orientação pedagógica da equipe musical da DOT/3, para assim iniciarem a regência de classes nas EMEIs, em duas horas semanais divididas em aulas de 15 a 20 minutos de duração por classe. A adequação do horário é feita entre a coordenadora pedagógica da escola e o estagiário. Ao completar o estágio, o participante entrega a ficha de estágio completa, com a assinatura da diretora da unidade escolar em que atuou, um relatório de avaliação preenchido e recebe um certificado de participação do projeto. A Unidade Escolar também envia um relatório avaliando os resultados da atuação do estagiário. Durante o ano de 1994, o projeto foi dividido em duas etapas com duração de 36 horas cada.
O relatório de avaliação do trabalho realizado durante 1994 aponta que o resultado obtido foi excelente, pois 100% das escolas atendidas querem a continuidade do projeto e, se possível, a presença garantida do especialista musical na EMEI. Destacaríamos também o grande interesse dos alunos de música ao se envolverem neste projeto de forma graciosa, percebendo a importância da experiência adquirida quando aplicam os conhecimentos teóricos na prática de sala de aula. Têm oportuni-dade de constatar, também, a necessidade de adequar sua postura e aprofundar conhecimentos relativos à faixa etária atendida.
Os caminhos certamente são difíceis, porém o desafio é cativante… se conse-guirmos alcançar nossos objetivos, certamente um novo caminho para a música será aberto nas escolas… sem dúvida, um alegre e agradável caminho!
Nossa missão estará cumprida.

Agradecimentos
À Secretaria Municipal de Educação como instituição possuidora da documentação utilizada.
À Diretoria e à equipe docente da Escola Municipal de Música da Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo, participando das apresentações didáticas musicais nas EMEIs.
As fotos do arquivo da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo são de autor desconhecido e foram publicadas no folheto “O que são os parques e recantos infantis de São Paulo”, em 1949. No presente artigo, as referidas fotos foram fotografadas desse folheto, por Neusa Scalea.

SANTA ROSA, N. S. The music education in the São Paulo’s public pre-school. ARTEunesp (São Paulo), v. 11, p.35-51, 1995.

Referências bibliográficas
1 GALWAY, J. A música no tempo. São Paulo: Martins Fontes, 1987.
2 MIRANDA, N. Origem e propagação dos paiques infantis e parques de jogos. São Paulo: Departamento de Cultura, 1941.
3 REVISTA ESCOLA MUNICIPAL (São Paulo), v.18, n.13, 1985.

Bibliografia consultada
CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. Brasília: SCP, 1988.
ENFRENTANDO O DESAFIO. São Paulo: SME, 1993.
GAINZA, V. H. La iniciación musical dei nino. Buenos Aires: Ricordi, 1986. . Nuevas perspectivas de la educación musical. Buenos Aires: Editorial Guadalupe, 1990.
PIAGET, J., INHELDER, B. Psicologia da criança. 13.ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1994. O QUE SÃO os parques e recantos infantis de São Paulo. São Paulo: Departamento de Educação, Assistência e Recreio, 1949.
SANTA ROSA, N. S. A educação musical na pré-escola. São Paulo: Ática, 1990.
SCHAFFER, M. O ouvido pensante. São Paulo: Editora UNESP, 1991.